quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Interioridade e Escuta 2

Conforme já comentei anteriormente, tenho participado e ajudado a divulgar um evento chamado Interioridade e Escuta. No dia 14/06/2007 ocorreu o terceiro encontro deste evento. Na ocasião, tivemos a presença do Prof. Mauro Amatuzzi, professor aposentado da USP e atualmente docente da PUC-Campinas, que ministrou a palestra “Pensando o sonhar com Tomás de Aquino”.

Segundo Prof. Mauro, é preciso levar em consideração que Tomás de Aquino, por ter vivido antes de Descartes (paradigma cartesiano), não partilhava da visão fragmentada e “separatista” entre matéria e espírito. De fato, para este teólogo medieval o sonho fica no cruzamento da espiritualidade com a animalidade. Neste sentido, abordando questões da psicologia moderna, o palestrante opinou que o olhar do psicólogo é mais próximo do teólogo (espiritual) do que do médico (material), considerando a visão dualista corpo e espírito. Da mesma forma que a teologia, a psicologia deve ver o ser humano a partir de seu interior e de seu sentido de vida.

Em relação a temas mais genéricos sobre o sonho, Prof. Mauro apontou que quando os sentidos externos cessam (sono), a imaginação fica livre. Ao contrário, quando estamos acordados, a imaginação funciona articulada com a razão e com nossos sentidos externos. Assim, de certa forma, o sonho seria a movimentação livre da imaginação durante o sono.

Mais adiante, Prof. Mauro explicou que para Tomás de Aquino não há muita preocupação em interpretar os sonhos, mas sim em dar-lhes um sentido. Deste modo, suas perguntas capitais nesta área foram: “O que é o sonho? O que representa isso?”. E, a partir destas questões, Tomás de Aquino fala dos sonhos através de um enfoque profético ou de revelação.

Para melhor entendermos esta abordagem, o palestrante descreveu os determinantes (causas) do sonho, cuja breve descrição se encontra a seguir:

  1. Anímico (psicológico): o sonho como conseqüência de desejos e pensamentos conscientes;
  2. Orgânico (corporal): o sonho tem uma função biológica, como fixação de memória e aprendizado. Ou seja, o sonho ajuda a concluir processos orgânicos e/ou cognitivos inacabados;
  3. Ambiental (externo): o sonho como reflexo de influências dos corpos celestes (astros) sobre a Terra; o ambiente externo (luz, sombra, “informações emocionais”, sutilezas) influencia processos (químicos, biológicos, etc);
  4. Espiritual: o sonho como experiência profética ou revelação; percepção da realidade (verdade mais profunda) por caminhos extraordinários e inusitados, sem que haja razões para a revelação (intuição).

Para Tomás de Aquino, cuja abordagem espiritual é a mais freqüente em suas teorias sobre o tema, é muito conveniente que Deus se revele em sonhos porque, enquanto acordados, nossa atenção (mente) está totalmente voltada às tarefas cotidianas e preocupações, que nos desviam das verdades mais profundas. Ou seja, a revelação divina traduz-se em um processo intuitivo, em uma ligação com a Fonte do Ser. Neste sentido, o silêncio interior – experiência obtida através da meditação e da contemplação – desempenha fundamental importância, pois nos coloca em um estado de predisposição para os processos intuitivos, para as revelações e para as graças divinas.

Ao encerramento de sua interessante palestra, o Prof. Mauro apontou algumas formas de se trabalhar os nossos sonhos: contá-los a familiares e amigos; registrá-los em um diário de sonhos; e expressá-los artisticamente (poesia, pintura, escultura, etc). Para maior aprofundamento sobre o tema, ele recomendou o livro “Psicologia e Espiritualidade” (Editora Paulus) e, por fim, ensinou a todos que: “Um sonho não lembrado é como uma carta não aberta”.

Aproveito para divulgar e convidá-los ao quarto encontro “Interioridade e Escuta”, a realizar-se hoje (10/10/2007) às 20hs. A palestra “Encontro: o espaço do não-saber na visão de um palhaço” será ministrada por Esio Magalhães, palhaço, ator e fundador do Barracão Teatro.

O EVENTO:
Interioridade e Escuta – Palestra: “Encontro: o espaço do não-saber na visão de um palhaço”.
Data e Horário: 10/10/2007 às 20:00.
Local: Casa Santo Inácio de Loyola – Rua Bernardo de Souza Campos, 148 (próximo ao Colégio Dom Barreto) – Ponte Preta – Campinas/SP.
Inscrições gratuitas através do e-mail stinacio@gmail.com, enviando nome e telefone.
Outras informações: (19) 3233-4181

1 comentário(s):

Anônimo disse...

Estive presente neste evento e gostei muito. Lembro-me, em especial, de duas questões: primeiro, a interpretação de S. Tomás sobre a criatividade como sendo um dos sentidos internos, o principal deles. Em segundo lugar, tive um pequeno problema com a causa espiritual mencionada na palestra, e bem elaborada em seu resumo. Cheguei a perguntar ao palestrante ao final da palestra, mas não consegui elaborar meu pensamento como queria. Tenho uma certa dificuldade em entender como Deus pode nos falar hoje através dos sonhos. Fiz uma breve consulta à Bíblia e encontrei a raiz “sonh” em 89 passagens, 81 vezes no Velho Testamento e 9 no Novo. Claramente os sonhos têm um papel distinto na revelação divina na era da Lei e na da Graça. Entendo os sonhos como forma de comunicação entre Iaweh e os homens, mas com a vinda de Jesus e, principalmente, com a vinda do Espírito Santo, me parece que os sonhos deixaram de ter sua importância profética e passaram a se submeter à verdade revelada e registrada nas palavras de Jesus e na obra (inclusive profética, através do dom da profecia) do Espírito Santo. Em poucas palavras, tenho uma séria dificuldade em aceitar que hoje alguém me diga que Deus lhe falou em sonhos e que tal revelação possa ser comparada com a da Bíblia. Tendo a achar os sonhos manifestações ou do inconsciente pessoal, ou do coletivo (em Freud ou em Jung), mas não como revelação profética.